Há algum tempo, penso nos possíveis fatores que possam
explicar a desordem que se observa em nossa sociedade.
Noticiários assustadores chegam
aos nossos olhares por meio da televisão. Atos de violência, que se finalizam
com mortes, tem sido motivo de preocupação, mais recentemente, no Estado de São
Paulo. E a população, em estado de choque, indaga-se do que pode estar levando
as pessoas a comportamentos tão brutais.
Hoje, lendo um livro: Do Direito
ao Pai, da autoria de Fernanda Otoni de Barros, percebi que a resposta pode
estar no processo de perda que vem sofrendo a autoridade paterna.
Antigamente, o pai era o chefe da
família, a voz que estabelecia a ordem, a palavra que não se questionava. À
mulher cabia obedecer e confirmar essa autoridade. O poder paterno era de tal
dimensão que, um filho homem só se tornaria homem depois que seu pai morresse.
Todo esse poder era legitimado pelas instituições jurídicas, pelas leis. Desta
forma procedeu-se nas Ordenações Filipinas, assim como no Código Civil de 1916.
O Estado não intervinha na família. A soberania do pai era absoluta e seu poder
incontestável. Receber o sobrenome do pai em seu nome era algo tão forte que
ajudava até mesmo no fechamento de negócios, na firmação de contratos. Qualquer
ato do filho só teria validade mediante a autorização do pai ou senão por intermédio
da emancipação.
Esse contexto em muito mudou a
partir da publicação do novo Código Civil e da Constituição de 1988. A partir
daí, homens e mulheres foram considerados iguais perante a lei. A maternidade
foi ganhando cada vez mais espaço, enquanto que o poder pátrio entrou em
declínio. O movimento feminista também colaborou para a modificação do quadro
anterior. Foi também instituída a Lei do Divórcio e as mulheres ganharam mais
poder com relação à guarda dos filhos. Além disso, ao Estado foi dada a
obrigação de proteger a família e, aqui, começou sua intervenção nas relações
familiares.
Não que eu discorde do avanço
legislativo. Pelo contrário, as leis precisam se contextualizar, precisam levar
em consideração os fatores sociais, históricos, culturais. Essa atualização é
imprescindível para que os instrumentos jurídicos se façam eficazes e
eficientes. Mas, é impossível não enxergar o equívoco que se formou em torno
dessa “igualdade” atribuída a homens e mulheres. Que somos iguais, todos
concordamos. Porém, há papéis que são e continuarão para todo o sempre sendo
fundamentais para a estruturação psíquica do sujeito e, consequentemente, para
a formação de sua identidade.
É inegável a poderosa simbologia
que tem a figura paterna na vida de uma criança. Sem ela, a criança não tem
acesso à lei, não conhece os limites imperiosos de uma vida em sociedade. E a
mulher, como mãe, tem uma função essencial nesta tríade (pai-filho-mãe): abrir
a porta de acesso para que seu marido instaure a interdição necessária ao
filho. Interdição essa que será base para a estruturação de uma vida psíquica
saudável.
Ao homem não deve ser delegado
apenas o papel biológico, de reprodutor, de ser que “empresta” o seu espermatozoide
para gerar outro ser. A paternidade não pode se resumir a uma confirmação de
teste de DNA. Pai é muito mais que isso. Sem ele, nossas crianças ficam á mercê
das drogas, dos atos infracionais, da prostituição e de tantos outros absurdos
que assolam a nossa sociedade e nos causam tanta angústia.
Não é o fato de a atual
Constituição garantir ao indivíduo o direito de ter acesso a sua verdadeira
paternidade que irá garantir um pai a um filho. É a mãe, antes de qualquer
legislação ou qualquer outra coisa, que assegurará o exercício da paternidade.
O discurso materno precede a ordem jurídica. Mais uma vez, quero deixar claro
que não se trata de desqualificar a ordem jurídica. Minha colocação é antes de
tudo uma convocação para que as famílias não deixem de exercer seu papel. Um
chamado clamoroso para que as mulheres não disputem com os homens nesta seara,
pois precisamos nos conscientizar que há funções que, segundo os conhecimentos
da Psicanálise, são determinantes para a constituição do sujeito e, se o pai
não consegue exercê-las, corremos um grave risco de ver comprometido o futuro
de uma criança.
Até nossa próxima publicação!
Um abraço
Thatianny Moreira